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Crise dos direitos laborais - ao encontro da Interjovem - CGTP


Para a nova edição da revista A Salto, “Desassossego: De Crise em Crise”, entrevistámos Dinis Lourenço, da Interjovem - CGTP. Antes de iniciarmos as perguntas, o Dinis explicou um pouco do trabalho da Interjovem e da própria CGTP.


Olá, boa tarde, obrigada pelo convite. A Interjovem é a organização específica da CGTP para os jovens trabalhadores. A CGTP é a Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses, que é uma intersindical nacional composta por vários sindicatos. É uma estrutura nacional de defesa dos direitos dos trabalhadores, das suas reivindicações e tem esses vários sindicatos que depois intervêm especificamente junto dos trabalhadores, compostos pelos trabalhadores. Depois tem também esta estrutura específica para os jovens trabalhadores, a Interjovem, que tem uma direção própria no sentido de intervir junto deste grupo. Composta por jovens trabalhadores, é orientada para as suas reivindicações específicas, mas também para a discussão, debate, e defesa dos direitos da juventude no sentido do aumento dos salários, do fim da precariedade, do fim dos horários regulados, promovendo também a criação de comissões de jovens nos vários sindicatos que fazem um trabalho mais específico.


Como é que a Interjovem e a CGTP avaliam a situação presente dos direitos laborais e condições de vida?


A avaliação que fazemos é de que nós estamos numa situação particularmente grave e que tem vindo a piorar de há algum tempo para cá. Continuamos com uma política de baixos salários para os trabalhadores, nomeadamente para os jovens trabalhadores, que impede a emancipação, a saída de casa dos pais. Há baixos salários geralmente: não só, mas também o Salário Mínimo Nacional, muito baixo, que não dá resposta às necessidades mais básicas. Soma-se à política de baixos salários que se mantém há vários anos, e que se vem agravando, uma situação de horários desregulados e de ritmos intensos de trabalho, a generalização do trabalho por turnos e noturno, o trabalho aos domingos e feriados. Portanto, ainda ao contrário do que é o avanço da ciência e da técnica, há uma intensificação dos ritmos de trabalho. Depois, uma grande precariedade dos ritmos de trabalho, que fazem com que estejamos sempre com “a corda na garganta”, sem saber se o contrato renova ou não, numa grande instabilidade que não permite depois aos jovens viverem desafogados. Esta situação com que nos vemos confrontados agora não é nova, mas tem vindo a piorar genericamente, no sentido de uma desvalorização dos trabalhadores. Trabalhadores que, ainda por cima, são aqueles que geram a riqueza - ela não lhes é distribuída, o que gera uma grande desigualdade e exploração. Isto confronta-se, para mais, com o aumento dos preços generalizado, a inflação, e a crise na habitação, que aumenta os preços seja nas prestações de juros das casas compradas, seja nas rendas, tornando a situação incomportável, principalmente para um jovem trabalhador.

Portanto, a situação que vemos é muito grave - não para toda a gente, porque há quem esteja a lucrar com esta situação, mas para os trabalhadores é uma situação preocupante. Não é inevitável, e há quem esteja a lutar por essa inevitabilidade, mas é preocupante.


Pegando precisamente no que está a falar, olhando para a trajetória política dos últimos anos, que medidas não foram tomadas, deveriam ser alteradas ou abolidas?


Como estava a dizer, assistimos a uma grande desvalorização do trabalho, e tem acontecido de há vários anos para cá. Tivemos um período de governo de direita e de ação da Troika, em que se implementaram uma série de alterações à legislação laboral. Poderia recuar até ao código do trabalho, mas vou focar-me mesmo só nas alterações que aconteceram no período da troika. Colocaram-se uma série de entraves à melhoria das condições de trabalho, algumas que foi possível reverter totalmente, nomeadamente a reposição dos feriados retirados nessa altura, outras em parte, com algumas carreiras que foram descongeladas mas não na totalidade, e outras nas quais não se mexeu. Desde 2015, quando tivemos esta alteração do panorama nacional, com o governo minoritário do Partido Socialista, houve algum recuperar de condições nesse sentido, mas houve medidas chave que não foram tomadas para melhorar a situação dos trabalhadores, nomeadamente dos jovens.

A título de exemplo, foi introduzida na legislação laboral uma norma que permite a caducidade dos contratos coletivos, ou seja: os contratos coletivos, que definem mínimos para os salários (porque costuma dizer-se que os salários não se aumentam por decreto, o único decidido pelo governo é o SMN e os da função pública), através de uma contratação coletiva entre os sindicatos e os patrões. Há agora uma lei que faz com que estes contratos coletivos possam caducar, revertendo aquilo que são os direitos já alcançados e bloqueando a contratação coletiva. Esta norma da caducidade faz com que os patrões possam dizer que deixam ir o contrato se não houver acordo, o que limita muito o poder dos sindicatos. Depois há o problema do tratamento mais favorável, que permitia que, se houvesse contradição entre um contrato coletivo e a lei, ou entre o coletivo e o individual, estava garantido que o que valia era a situação mais favorável ao trabalhador – isto foi retirado e não foi reposto. Há uma série de alterações à lei que o PS, curiosamente, criticou na altura, mas que agora não repôs.

Antes, pelo contrário, aprofunda ainda mais com alterações legislativas que foram feitas e depois rejeita outras, nomeadamente a redução do horário de trabalho, às 35 horas, as limitações de trabalho noturno e por turnos, o aumento do salário mínimo, um valor que nós exigimos. Portanto, acho que há ainda muito por fazer e acho que há uma grande falta de vontade política para alterar isso.


Esta persistência de um ordenado mínimo e médio tão baixos em Portugal é bastante impactante, mas quais são as implicações disso em comparação com os outros países da Europa?


Por um lado, logo à partida, e de uma maneira bastante óbvia, há o piorar das condições de vida dos trabalhadores, nomeadamente dos jovens. O salário mínimo nacional está agora nos 755 euros. É desafiante encontrar um quarto, já nem digo um apartamento, que não nos leve uma fatia gigante deste salário, ou conseguir que o aumento das taxas de juros não leve um terço deste salário. Nós já estamos a ter uma situação bastante grave, que é de trabalhadores, nomeadamente jovens trabalhadores, a empobrecer a trabalhar. Ou seja, pessoas que chegam ao final do mês com menos dinheiro do que o que tinham no início do mês, e que estão a trabalhar. Temos conhecimento de muitos casos de trabalhadores, pessoas que trabalham, a pedirem ajuda a instituições de solidariedade social. É incomportável que uma pessoa que trabalhe, que produza todo o mês, não tenha um salário que chegue até ao final do mês. Portanto, esta é uma consequência. Mas há mais. Se a perspetiva que o jovem trabalhador tem é a de salários muito baixos, mesmo com qualificação, não fica cá. E é o que estamos a ver muito a acontecer, não é? Muita malta jovem que já está a decidir que não vai ficar em Portugal. Este país não valoriza o seu trabalho, e partem para outra.


"Nós já estamos a ter uma situação bastante grave, que é de trabalhadores, nomeadamente jovens trabalhadores, a empobrecer a trabalhar. "

Durante o período da Troika, não tínhamos aumento do salário mínimo nacional, tínhamos salários congelados. Depois, em 2015, a coisa melhorou um bocadinho, houve um aumento maior (sendo que não significativo e não o que precisávamos) do salário mínimo nacional. Houve uma alteração e um boost para a economia portuguesa, porque ela vive do consumo português. Ou seja, nós vivemos, essencialmente, de consumo interno. Ora, se as pessoas não têm dinheiro para gastar, não vão gastar dinheiro. É tão simples quanto isto, não é? Isto reflete-se na economia. Assim, mantêm-se os baixos salários, que são uma limitação muito grande àquilo que é a capacidade produtiva do país, porque, como os salários são baixos, não se investe na produção nacional. No entanto, há quem fica a lucrar com estes baixos salários, aliás, eu diria que é por isso que estes salários são tão baixos; vimos este ano que passou lucros recorde na banca, na grande distribuição, na energia. Os exemplos mais claros são estes: a grande distribuição (Sonae, Johnny Martins, Pingo Doce, Continente, Auchan, etc), que paga salários muito baixos, o salário mínimo nacional é muito perto disso, cobra preços altos que aumentaram, com lucros recorde. Portanto, alguém está a ganhar com esta política de baixos salários. Não são os trabalhadores, nem os trabalhadores, nem os reformados, porque depois quanto menos se recebe, menos se desconta - menos dinheiro para a Segurança Social -, nem o país.


E neste contexto, como é que a CGTP avalia a nova legislação sobre o trabalho aprovada pelo governo e a Agenda do Trabalho Digno?


Primeiro, existiu uma grande propaganda à volta da questão. Ao analisar, podemos concordar e convergir na avaliação que a agenda faz da situação do país e dos jovens trabalhadores, que está, genericamente, correta, não é? Da situação de baixos salários, de precariedade e tudo mais.

Depois quando vamos ver as soluções, elas não estão lá. Ainda hoje estávamos a ver, por exemplo, a questão de limitar agora para quatro as renovações dos contratos a prazo. Mas e depois? Ou seja, é estar adiar um problema. A agenda de trabalho digno e de valorização dos jovens trabalhadores, tem muita propaganda em torno de si, muitas medidas que tentando, mudando uma coisa ou outra, não mudam absolutamente nada no fundo. Além disso, colocam ainda dificuldades, não revogando a capacidade da contratação coletiva, acrescentam ainda passos que poderão dificultar ainda mais a situação. As alterações que seriam mesmo precisas para os trabalhadores, esta agenda não os faz. E não as faz porque não quer, porque poderia. A revogação da norma da capacidade da contratação coletiva poderia estar nessas alterações à legislação laboral e não está. Portanto, isto é muito manifestamente insuficiente, vai em sentido contrário àquilo que se quer para os trabalhadores e não faz praticamente nada. E nesta altura, não fazer nada é estragar. Porque os trabalhadores estão a precisar urgentemente de soluções. O aumento do salário é uma urgência. Portanto, avaliamos negativamente esta agenda, a não ser como propaganda - como propaganda parece-nos um objeto com eficácia.


Relacionado com o que já tinha falado de uma das consequências dos salários baixos ser a imigração, o que se pode fazer para mitigar a precariedade jovem em Portugal e a chamada fuga de cérebros para o estrangeiro?


Logo à partida, genericamente valorizar o trabalho dos jovens, as carreiras e as profissões. Isto faz-se de várias maneiras, identificando os problemas e depois as soluções. Por um lado temos o problema dos baixos salários. Precisamos não só de um aumento do salário mínimo nacional, que é baixíssimo e não permite que se pague aquilo que é necessário para ter uma vida digna em Portugal. Nenhum trabalhador pode receber como salário menos do que o que seria necessário para ter uma vida digna.

E o salário mínimo nacional não permite isso, hoje. Por outro lado há a necessidade de uma valorização das carreiras e das profissões. E para isto é preciso dar força à contratação coletiva, porque é nela que se definem os valores a pagar na carreira de técnico superior, na carreira de tradutor, numa série de carreiras e de profissões mais qualificadas. Ora, com uma norma que faz com que se os patrões e os sindicatos não chegam a acordo, o contrato vai abaixo, há uma chantagem que a gente não pode aceitar.


"Nenhum trabalhador pode receber como salário menos do que o que seria necessário para ter uma vida digna."

A outra coisa que é preciso atacar é a precariedade, que é urgente. E para isto precisamos, primeiro, que a lei pressuponha que a um vínculo de trabalho permanente corresponde um posto de trabalho permanente. Ou seja, que todos os trabalhadores que ocupam postos permanentes tenham um vínculo efetivo à empresa para a qual prestam o serviço. Isto permitiria criar condições para exigir que não haja eternização de contratos a prazo num posto de trabalho. Permitiria também evitar a utilização de empresas de trabalho temporário que parasitam a relação de trabalho, os falsos recibos verdes, que são uma generalidade em vários setores, a utilização de estágios para suprimir postos de trabalho, etc. Um contrato a prazo deveria ser uma exceção das exceções, com regras muito definidas e com razões muito estabelecidas para existir. Atualmente, a lei permite que qualquer posto de trabalho seja ocupado por um vínculo precário com um contrato a prazo. Não basta aqui uma alteração na lei, tem também que se fazer pressão. Onde se tem conquistado isto, é onde os trabalhadores fazem força com os seus sindicatos; ações de luta, plenários à porta das empresas, greves, abaixo-assinados.


Aproveitando agora um bocadinho a deixa para falar um pouco mais da ação da CGTP e da Interjovem, como é que a organização avalia a sua ação? Ou seja, sentem que as estratégias de luta que estão a ter impacto nos direitos dos trabalhadores?


Nós temos uma diversidade muito grande de tipos de intervenção para a resolução dos problemas dos trabalhadores. E que, já agora, que são os próprios trabalhadores que as definem; no local de trabalho, se se vai fazer uma greve, por exemplo, são os trabalhadores que vão fazer. Os sindicatos são os trabalhadores organizados e, portanto, são eles que farão essas ações de luta. Recentemente, tem havido um crescente de luta este ano, que, aliás, culminou no mês de Março, com a Semana da Igualdade, em que tivemos, em torno do Dia Internacional da Mulher, muitas ações em empresas e locais de trabalho, colocando as questões da igualdade, que ainda não são uma realidade em Portugal, o ataque ao direito à maternidade e paternidade, o ataque aos horários, à conciliação entre a vida familiar e pessoal, diferenças salariais entre homens e mulheres, etc.

Depois tivemos, no dia 18 de Março, uma manifestação nacional imensa em Lisboa, em torno do aumento geral dos salários, do aumento das pensões, de fazer face ao custo de vida, que foi um grande sucesso com milhares de trabalhadores na rua, muitos deles em greve, que vieram com as suas faixas, com as suas pancartas dos seus locais de trabalho, alguns deles fardados, com um impacto muito grande. No dia 17 de Março, ainda antes da manifestação, tivemos uma greve nacional da administração pública que teve um impacto impressionante. Tivemos no dia 28 de Março ações de luta da Interjovem em Lisboa e no Porto, manifestações com milhares de jovens trabalhadores na rua, um caudal de luta muito grande e que já teve alguns efeitos. Nós vimos agora, ainda há umas semanas, que o Governo anunciou a necessidade dos aumentos intercalares, vindo depois anunciar aumentos miseráveis, mas veio dizer que era preciso haver aumentos intercalares. Essa necessidade veio, não foi porque o Partido Socialista quis nem que o Governo quis. Foi depois da greve nacional e da administração pública e da administração nacional que o Governo se viu obrigado a fazer isto. Mesmo as medidas de combate à inflação,o Governo foi forçado a elas pela movimentação e pelo uso dos trabalhadores. São medidas que manifestamente não servem, nomeadamente a questão do IVA zero e uma série de outras coisas que não só não servem como são prejudiciais - estamos a ver que os preços não estão necessariamente a diminuir.

Tivemos ainda, em imensas empresas e locais de trabalho, patrões que foram forçados pela luta dos trabalhadores a aumentos intercalares. Vou dar-vos um exemplo. O grupo Inditex (Zara, Bershka, o dono é um dos homens mais ricos do mundo) teve uma ascensão muito grande de luta dos trabalhadores, com plenários à porta, greves e tudo mais. Trabalhadoras, a maior parte delas mulheres jovens, tiveram um aumento, no início do ano, de 70 euros, e um aumento de 130 euros em abril. Foi, precisamente, no culminar do processo de luta que os trabalhadores tiveram. Claro que a empresa vai dizer que não tem nada a ver com a luta, mas é uma curiosidade, é uma coincidência muito grande, a partir do momento em que se começam a fazer imensos plenários, que a empresa faça um aumento desta natureza. E, portanto, a luta, claramente, com as formas muito diferentes que tem tomado, tem tido, efetivamente, resultado.


Os números do sindicalismo têm diminuído consistentemente desde os anos 70 e 80. Este ano, no qual o sindicalismo tem estado cada vez mais ativo e tem havido uma grande quantidade de greves. Considera que isso pode ser um sinal de que estamos a sentir um ressurgir do sindicalismo e do envolvimento dos trabalhadores?


De facto, temos tido uma ascensão muito grande na luta, apesar de isto nunca ter parado. Aliás, nós vimos isso não só no período antes da pandemia, como também durante a pandemia, em que, apesar de tudo, não parámos. Apesar de todas as dificuldades e entraves colocados, a gente não parou e este intensificar da luta está a acontecer. Acho que há fatores vários para a queda das sindicalizações, nomeadamente o facto de nós termos tido um ataque constante à contratação coletiva, que é uma das ferramentas que os sindicatos têm e que permite que os trabalhadores identifiquem o sindicato. Quando se tenta esvaziar a contratação coletiva, que tem sido o processo que se tem feito até agora, isto terá efeitos naturalmente na sindicalização.

Há depois o processo que temos visto de precarização das relações de trabalho - os contratos a prazo, os falsos recibos verdes e a generalização que isto está a ter, porque está a aumentar bastante. Aliás, nós vimos agora que 70% do emprego criado é emprego com vínculos precários e, portanto, isto tem um impacto muito grande na sindicalização. Muitos trabalhadores, e nomeadamente jovens trabalhadores têm medo ou acham que não se podem sindicalizar por estarem com vínculo precário. Isto são crenças que tem de se ir desfazendo e temos um trabalho árduo nesse sentido. Há também uma ofensiva ideológica muito grande para não se sindicalizarem. Não só há pressões dos patrões, mas há até esta ideia de individualismo que vai minando o pensamento dominante, e que é exatamente o contrário daquilo que os trabalhadores precisam. A força dos trabalhadores está quando eles se unem, porque nós somos a maioria, a maior parte das pessoas são trabalhadoras, e, portanto, a sua força está na unidade. São os trabalhadores que, quando saem da fábrica, a fábrica não produz. Uma coisa é verdade: mais luta vai significar, sem dúvida alguma, mais sindicalização. Quando os trabalhadores veem que, unidos, organizados, conseguem conquistar coisas, é aí que vem o sindicato.


" [...] 70% do emprego criado é emprego com vínculos precários e, portanto, isto tem um impacto muito grande na sindicalização. "

Quando os jovens trabalhadores reconhecem o sindicato e o veem lá nos seus locais de trabalho, percebem que isto vale a pena. Percebem que sindicalizar-se vale a pena. Muitas das vezes os jovens trabalhadores até têm menos preconceitos que os trabalhadores mais velhos em relação aos sindicatos. Depois há muita confusão, não se sabe qual é a diferença entre um partido e um sindicato, acha-se que o sindicato é uma repartição das finanças, é um serviço que está ali para resolver os problemas, e é mais do que isso. Os trabalhadores organizados são o próprio sindicato, que é o que os trabalhadores quiserem fazer dele. E acho que isso vai estando cada vez mais presente junto dos jovens trabalhadores.


Voltando agora um bocadinho outra vez à CGTP, considera que o Conselho Económico e Social é um instrumento útil para definir acordos entre as entidades patronais e sindicais?


É assim, a CGTP, já há uns anos, que vem participando na Concertação Social e que participa nas discussões. Nós consideramos que nada substitui a luta dos trabalhadores. Nada substitui, nos locais de trabalho, aquilo que é a relação entre o trabalhador e o patrão. Tal como nada substitui os trabalhadores elaborarem as suas reivindicações, apresentarem-nas ao patronato, seja numa empresa, seja num sector, nomeadamente. Por exemplo, os trabalhadores das corticeiras, com o seu sindicato, apresentam uma proposta à Associação Patronal das Corticeiras com as suas reivindicações. Se for uma delegação apresentar as reivindicações e o patrão olhar para trás deles e não está lá ninguém, ele não aceita, mas se os patrões olharem para trás da delegação e virem que estão os trabalhadores parados à espera da resposta, já vai com outra dinâmica.

Apesar de tudo, temos esta ferramenta da concertação social na qual a CGTP tem participado. No entanto, já no passado aceitou e firmou acordos em concertação social que depois nem sequer foram cumpridos. Portanto, o que nós vemos é que este instrumento tanto não substitui que é uma ferramenta que o Patronato usa e que está dependente do compromisso que os governos na altura têm ou com o Patronato ou com os trabalhadores. E o que nós temos visto constantemente é que os governos têm tido compromissos essencialmente com o Patronato. Todos os acordos que têm saído lá, vejamos agora este último chamado de rendimentos para a produtividade, que define mínimos olímpicos de aumentos salariais; 5,1% este ano de aumentos salariais é empobrecimento. É votar os trabalhadores ao empobrecimento. E o facto de se criar estes acordos faz com que o Patronato se sinta com as costas com as costas quentes para dizer não, a gente não vai acima disto. Não foi a CGTP que assinou aquilo, a gente não se compromete com nada daquilo. Houve organizações sindicais que aceitaram. Ora, isto coloca aqui um tampão, coloca aqui um teto para aumentos e que não pode ser. A avaliação que nós fazemos é: é um espaço importante para a gente participar de facto, mas não é ali que se decide, é no local de trabalho que se decide o nó da questão.


Pronto, para terminar temos uma última pergunta, que é ao examinar o presente, quais são as aspirações da CGTP para o futuro e quais é que são os principais obstáculos que vamos enfrentar?


As nossas aspirações, tanto da CGTP como da Interjovem, é de facto que tenhamos perspectiva de futuro em Portugal, ou seja, que tenhamos condições para viver e trabalhar aqui., numa perspectiva de valorização dos trabalhadores. Se um jovem trabalhador nasceu aqui, criou aqui as suas raízes, tem aqui os seus amigos e a sua família, foi aqui que estudou, é aqui que quer viver e é aqui que quer trabalhar. Porque é o trabalho que nos permite a emancipação e a independência. Um jovem trabalhador que escolha Portugal para viver, do Brasil, do Nepal, os imensos que têm vindo, quer que seja um sítio em que o trabalho de facto emancipe e não explore, que é o contrário do que está a acontecer, nomeadamente para a população imigrante que tem vindo para Portugal, e portanto seja um sítio que acolha e que tenha condições de trabalho dignas e não condições de trabalho degradantes. E, portanto, que haja um futuro de desenvolvimento, de investimento na produção nacional, de investimento na soberania nacional, de podermos ser autossuficientes e colaborar com os outros países. Esta é a perspectiva que nós temos de futuro.

Eu acho que o obstáculo que está aqui colocado é esta insistência numa política de direita que tem colocado os trabalhadores num caminho de baixos salários, de precariedade, de ataque aos direitos dos trabalhadores, de condições de ataque ao direito sindical, à liberdade sindical, de precariedade, de horários desregulados. Por exemplo, uma perspectiva de futuro que nós temos já, mais imediatamente, por exemplo, é a questão das 35 horas de trabalho para todos, que consideramos ser uma questão de progresso social básica. Os avanços da tecnologia e da ciência têm permitido que um trabalhador produza exponencialmente mais do que produzia há 10 , 15 anos, 20 ou 100 anos atrás e, no entanto, continuamos com as 40 horas de trabalho. E mais, não só continuamos com as 40 horas de trabalho, como há muitos trabalhadores que trabalham mais de 40 horas por semana, que trabalham mais de 8 horas por dia, com horários brutalmente desregulados, nos quais sabem num dia que no dia seguinte vão trabalhar. Deveria ser ao contrário. Nós deveríamos estar a reduzir os horários de trabalho e não a aumentar. E nem sequer com esta ideia que agora apareceu outra vez, dos 4 dias por semana, o que se perspectiva era uma manutenção da semana das 40 horas, aumentando a carga horária de cada dia. Ora, isto é um retrocesso.

Portanto, a gente precisa de olhar para a frente, progredir, de dar melhores condições de vida e de trabalho, porque dando mais condições de vida e de trabalho aos trabalhadores eleva-se as condições de vida e de trabalho de toda a gente, dos reformados, das crianças, dos jovens, dos estudantes e é por aqui que a gente tem que progredir.


 

Sobre o entrevistado:

Dinis Lourenço foi entrevistado como representante da CGTP e da Interjovem:

CGTP, a maior confederação sindical do país, reune sindicatos de diversos sectores da economia portuguesa, luta ativamente, desde 1970, para melhorar e dar voz à classe trabalhadora. Interjovem, um sindicato membro da CGTP, focado nos problemas da juventude trabalhadora e estudantes, tendo desenvolvido uma importante atividade na luta pelos direitos dos jovens.


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